Natalia Dias: Queremos paridade no país, onde 51,1% da população é composta por mulheres

Conheça iniciativas e ações empreendedoras que propõem mais equilíbrio na diversidade de gênero no mercado financeiro.

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Natalia Dias, coordenadora do grupo de trabalho do Club chamado Financial Eco System e CEO do banco de investimento sul africano Standart Bank. (Foto: Divulgação)
 
O estudo “Mulheres em Ações”, realizado pela B3 – a Bolsa de Valores brasileira, revela que das 408 compa- nhias de capital aberto no país, 61% não possuem mulheres no quadro de diretores estatutários e 45% não têm participação feminina no Conselho de Administração, de modo geral. Quando consideradas as companhias com apenas uma mulher nessas funções, o per- centual atinge 25% nos cargos de diretoria e 32% em conselhos.
 
Um levantamento feito em junho deste ano pela plataforma global de dados finan- ceiros Comdinheiro a pedido do Valor Investe, indica que no comparativo  dos últimos cinco anos, houve aumento na participação feminina em Conselhos de Administração das empresas de capital aberto, índice que cresceu de 6,9 para 16,1%. Porém no caso dos car- gos de diretoria, a participação de mulheres é ainda menor, com 12%.
 
Com o objetivo de melhorar essa realidade, uma organização criada no Reino Unido, opera em 18 países por meio de grupos de trabalho que disseminam informações para conscientizar membros do alto escalão para a importância da diversidade de gênero e trabalham a oferta, consolidando informa- ções e promovendo profissionais que já estão preparadas para os cargos de alta liderança. 

“Nosso objetivo é ter paridade, refletindo a realidade do país onde 51,1% da popu- lação é representada por mulheres. Mas há estudos que mostram que com 30% de re- presentatividade já conseguimos promover uma transformação. É por isso também que nosso foco são os Conselhos de Administração, pois entendemos que precisamos mudar o topo para conseguirmos mudar as regras do jogo, em um movimento estruturado”, explica Natalia Dias, coordenadora do grupo de trabalho do Club chamado Financial Eco System e CEO do banco de investimento sul africano Standart Bank.

Do outro lado do balcão

Fora do ambiente profissional, a presença feminina no mercado financeiro também é bem menor em relação à participação dos homens. Em maio deste ano, pela primeira vez o número de CPF de mulheres registrados na B3 atingiu o marco de um milhão. Apesar de ser um avanço, o caminho ainda é longo, já que o montante representa 28,5% do total de investidores.
 
Outra estratégia para mudar esse cenário está na iniciativa da especialista em ações da Clear Corretora, Pietra Guerra, com incentivos de engajamento. “Quando chegamos a essa marca, a Clear lançou o projeto ‘Rumo aos dois milhões’, que tinha por objetivo dobrar esse número até março de 2022. Mas estamos vendo um crescimento tão interessante que no final de setembro lançamos a campanha #Bolsaporelas com um ideal ainda mais ousado: chegar aos dois milhões até final de 2021 e três milhões até 2023”, diz.
 
Como parte da campanha que busca estimu- lar as mulheres que já operam na Bolsa de Valores a serem inspiração e ajudarem outras que pensam em investir atraindo novas entrantes, incentivando a troca e o aprendizado para quebrar essas barreiras, foi criado um grupo no Telegram com influenciadoras da XP Inc. Em dois meses, quase 500 mulheres passaram a se inteirar sobre o assunto diariamente pelo canal. “A ideia é que elas se sintam mais conectadas, mais incluídas. Estamos reforçando o time e procurando o público feminino em diferentes canais. E tem dado certo já que hoje uma em cada quatro mulheres na B3 são clientes da Clear”, acrescenta Pietra.
 
Pietra Guerra, especialista em ações da Clear Corretora lançou a iniciativa #Bolsaporelas com o intuito de oferecer oportunidade a milhões de mulheres até 2023. (Foto: Divulgação)
 

Tudo mais diverso

A busca por maior equilíbrio tem um cunho social e vai ao encontro da maior preocupação com as questões ESG (sigla em inglês para Ambiental, Social e Governança) para a qual o mercado vem apontando. Tendo em sua empresa 70% do quadro composto por mulheres, a sócia-fundadora e executiva responsável pela Alocc, Sigrid Guimarães, avalia que conselhos mais diversos tendem a obter retornos financeiros mais altos. Eleita pelo E-Investidor/Estadão como uma das dez principais mulheres do mercado financeiro, ela afirma que “as empresas que não se atualizarem vão ficar para trás, principalmente agora que está se dando tanta importância às práticas de ESG”.
 
Para Sandra Blanco, estrategista-chefe da Órama Investimentos e responsável por um dos primeiros clubes de investimentos para mulhe- res no Brasil, além de melhores resultados, a diversidade contribui para que as empresas con- sigam atrair mais jovens talentos. Também na lista das dez mulheres de destaque no mercado financeiro, ela destaca a importância de avaliar as questões dos pilares ESG na tomada de de- cisões sobre os investimentos que, segundo a estrategista-chefe, ainda que inconscientemen- te, já estava na pauta do clube de investidoras criado por ela há 20 anos.
 
Com esse movimento, o fundo internacional de ações Trend Lideranças Femininas, da XP Asset Management mostra resultados. No seu primeiro ano de existência, completado em setembro de 2021, o fundo teve rendimento de 34,8%. Essa rentabilidade é até melhor que a da Bolsa americana, que foi de 33,6%. A refe- rência do fundo é o ETF SHE (fundo de índice estrangeiro), que seleciona entre as mil compa- nhias com maior valor de mercado nas Bolsas de Nova York as que possuem proporcionalmente o maior número de mulheres ocupando cadeiras nos Conselhos de Administração, como CEOs ou demais cargos ‘C-Levels’.
 
Mulheres a bordo
 
A B3 foi pioneira a atrelar os papéis a duas metas para destacar empresas que têm mulheres no Conse- exclusivamente sociais: criação, até 2024, de um índice lho de Administração ou em Conselhos Consultivos e de diversidade de gênero para mostrar quem são as que visa engajar o board na discussão de equidade de empresas que têm bons indicadores e medir sua per gênero. A B3 também apoia o Programa Diversidade formance nessa área, e atingir, até 2026, o percentual de em Conselho (PDeC), que tem como principal objetivo 35% de mulheres em cargos de liderança na B3. Quanto melhorar a participação da mulher no ecossistema de ao Conselho de Administração, a instituição é signatária Conselhos de Administração, Conselhos Fiscais e comitês do Women on board (WOB), iniciativa independente de organizações públicas, privadas ou do terceiro setor.

Sigrid Guimarães, CEO da Alocc, é a nova colunista da EXAME Invest | Exame  Invest
Sigrid Guimarães, fundadora e executiva responsável pela Alocc, endossa a importância na mudança cultural das empresas, prospectando o futuro. (Foto: Leo Avessa)

Em uma carta aberta em comemoração pelo aniversário do fundo, Paula Zogbi, analista de investimentos da Rico, que distribui a aplica- ção, aproveita para trazer mais detalhes sobre o desempenho financeiro positivo de companhias que investiram em diversidade. Na América La- tina, um estudo da McKinsey mostrou que empresas com pelo menos uma mulher no quadro executivo têm 50% mais chances de aumentar a rentabilidade e 22% de crescer a média da margem Ebitda. Em outra pesquisa mais re- cente (2020), a mesma Mckinsey mostrou que empresas no quartil superior em diversidade de gênero nos cargos executivos (ou seja, as 25% mais bem posicionadas) têm 25% mais probabilidade de apresentarem lucros acima da média do que as do último quartil”, destaca.

Mercado

A mudança cultural deve levar tempo, mas, conforme reforça Sigrid Guimarães: “É preci- so estabelecer metas de igualdade de mulheres em cargos de liderança. Daqui para frente, as empresas precisarão viver uma ressignificação para prosperar. Se antes elas eram valorizadas apenas pela capacidade de gerar lucro, hoje, só as que assumirem responsabilidade pelo que está ao redor e buscarem entregar valor a todos  que fazem parte de seu ecossistema (clientes, colaboradores, fornecedores e comunidades) estarão aptas a competir de verdade e a entre- gar resultados consistentes em longo prazo de forma responsável. Dentro disso está também a igualdade em cargos de liderança e na equipe. Isso se faz com contratações em vagas exclusi- vas para mulheres e outros grupos que fujam do estereótipo atual das lideranças”, sentencia Sigrid Guimarães.