Joaquim Levy: economia Russa é muito parecida com a brasileira. Tanto no seu tamanho quanto no protagonismo das commodities e PIB
Sanções e a falta de insumos da Rússia e Ucrânia podem impactar diretamente o Brasil, avaliam especialistas.
Capital ucraniana Kiev no dia 24 de fevereiro (Foto: Gabinete do Presidente da Ucrânia via EBC)
Conflitos bélicos, como os que ocorrem na Ucrânia, podem prejudicar a frágil economia mundial, que tenta se restabelecer após uma pandemia, em vista que a execução internacional de acordos que envolvem os países conflitantes acaba sendo comprometida.
Com isso, além do aumento do preço dos combustíveis, a queda na oferta de commodities como trigo e milho, exportados em grande escala pela Rússia e Ucrânia, deve pressionar os preços dos alimentos comercializados no Brasil, isso não só enquanto durar a guerra, mas por um longo período com o fim do conflito, segundo especialistas.
Caio Mastrodomenico, analista econômico e CEO da Vallus Capital. (Foto: Divulgação)
Caio Mastrodomenico, analista econômico e CEO da Vallus Capital, explica que para investidores, guerras são sinônimo de incertezas. Por isso é importante que exista cautela ao alocar ou realocar os investimentos em ativos relacionados diretamente a esse conflito, como petróleo e minerais.
“A Rússia é muito forte na produção de petróleo, minerais e minérios, enquanto o Brasil não é autossuficiente em nenhuma dessas áreas. Ainda assim, com as sanções aplicadas ao país, é possível que uma via se abra para a venda de alguns desses produtos e de insumos agrícolas, mas dificilmente qualquer país substituiria a Rússia”, explica.
Estratégia
No entanto, existem também outros efeitos que estão ocorrendo, como a suspensão de novas compras e contratos de fosfato e enxofre, itens fundamentais para as lavouras. “A longo prazo sentiremos a escassez de minerais russos empregados nas lavouras brasileiras e isso impactará de maneira negativa o nosso PIB futuro. Produtos como chips e condutores, já escassos, também podem ter perda devido à falta de metais nobres russos”, finaliza.
Apesar do cenário negativo, o especialista em recuperação de empresas e CEO da BeYou Education, Ricardo Souza, afirma que não é o momento para desanimar e diz que o governo dispõe de meios de neutralizar alguns desses aumentos para que eles não cheguem até a população. Souza avalia que o nosso país recebe muitos investimentos neste período pós-pandemia, o que tem facilitado o acesso ao crédito tanto por parte da população, quanto dos empresários. “A questão é saber se o governo terá uma estratégia para cada situação”, pontua.
Para entender o momento
Joaquim Levy, diretor de Estratégia Econômica e Relações com Mercados do Banco Safra (Foto: Divulgação)
Como o Banco Central deve agir neste momento, estamos no caminho certo?
O Banco Central tem que focar nos efeitos de segunda ordem, a difusão dos choques pela economia, para evitar que outros problemas financeiros se tornem processos inflacionários, se propagando no transcorrer do tempo. A taxa de juros é o principal mecanismo para enfrentar esse desafio, especialmente quando olhamos para 2023.
Diante desse cenário conflituoso, os investidores tendem a buscar oportunidades no Brasil?
A economia Russa é, em muitos aspectos, parecida com a brasileira. Tanto no seu tamanho quanto no protagonismo das commodities nas exportações e no PIB. Evidentemente parte da demanda que deixe de ser atendida pela Rússia poderá procurar alternativas no Brasil. Também na parte de fluxos de capitais, na medida em que algumas empresas russas não encontrem espaço nos índices de ações ou nas carteiras internacionais, parte dos recursos podem migrar para o mercado brasileiro. Esses efeitos, evidentemente, podem não ser permanentes.
Quais setores podem ser beneficiados e como manter esse fluxo de capitais de maneira mais orgânica e contínua?
Além das commodities, até a parte de softwares, games e o mercado cibernético, no geral, também pode ser afetado positivamente. Se programadores russos não podem ser pagos (a não ser em cripto moedas), a demanda por brasileiros deve subir. Creio que o Brasil tem essas qualidades, e pode oferecer excelentes produtos para empresas em todo canto do mundo. Vale aproveitar para dizer que a demanda por pessoas com conhecimentos digitais está muito aquecida no Brasil, tornando os esforços de treinamento dos jovens nessas técnicas cada vez mais urgente e importante para o país. O Safra tem feito parcerias para aumentar o número de pessoas bem formadas, e quanto mais o setor privado se envolver com esse tipo de iniciativa, mais seremos competitivos e mais oportunidades serão oferecidas para os jovens no Brasil todo.