Adriana Dupita, da Bloomberg Economics: 'Mandato presidencial começa com difíceis decisões fiscais: prorrogar ou deixar expirar os cortes temporários de impostos de 2022'
Especialistas elencam os principais desafios para o novo governo e para todos os brasileiros.
O presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, tem à frente diversos desafios no aspecto socioeconômico. (Foto: Ricardo Ricardo Stuckert)
Luiz Inácio Lula da Silva, do PT, foi eleito novamente presidente da República do Brasil, no dia 30 de outubro de 2022, ao derrotar Jair Messias Bolsonaro, do PL, no segundo turno de uma disputa polarizada. Apesar da apuração acirrada, o petista saiu como o presidente mais bem votado da história brasileira, com 60.345.999 votos (50,90%) contra 58.206.354 votos (49,10%) de seu opositor. Eleito em 2002 e reeleito em 2006, Lula comandará o país pela terceira vez. Com 77 anos, será o presidente mais velho a assumir o cargo. Líderes de várias nações e políticos brasileiros o parabenizram pela vitória. O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, cumprimentou o novo chefe do Executivo por meio de nota, pouco tempo depois da apuração das urnas. O presidente da França, Emmanuel Macron, afirmou que ambos enfrentarão unidos “muitos desafios comuns”. Já o primeiro-ministro canadense Justin Trudeau afirmou que “está ansioso para trabalhar” com o futuro presidente.
Se as pautas eocnômicas têm sido apontadas como o principal ‘calcanhar de Aquiles” para a expansão do Brasil, o que dizer dos entraves subjacentes com a saúde, educação, infraestrutura e questões sociais? Os desafios a curto, médio e longo prazo são gigantescos, e após as eleições, o período será de recalcular a rota desse grande navio.
De acordo com o professor doutor Ahmed Sameer El Khatib, coordenador do Instituto de Finanças da Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado (FECAP), ainda que o país consiga se restabelecer de um quadro macroeconômico estável, a economia estará paralisada e a indústria afetada pelos efeitos adversos dos últimos anos.
“O próximo governo vai ter um imenso desafio que é além da gestão da política econômica, uma vez que em 2023 colheremos os resultados ruins de decisões fiscais que foram tomadas. “A estabilidade é o principal pilar do crescimento e condição essencial para o avanço de outros temas estruturais, pois a fragilidade econômica reduz o espaço para a negociação política. Como fazer isso de forma conjunta e permanente é a pergunta do milhão que deverá ser respondida pelo atual e próximo governos”, salienta El Khatib.
Para Antonio Wrobleski, engenheiro, com MBA na NYU (New York University), membro do Conselho da BBM Logística e sócio da Awro Logística e Participações, em 2023 “continuarão os mesmos grandes problemas nas áreas de educação, saúde, baixo crescimento e inflação alta. A próxima gestão vai assumir uma dívida monstruosa, muito próxima do teto, e vai ter que fazer opções, tirar de um lado e colocar no outro. Vai assumir uma inflação alta, juros altos e será necessário um plano econômico-financeiro de recuperação. Vai ter que fazer aquilo que todo governo promete e não faz, usar os seis primeiros meses para alinhavar esse planejamento para o próximo quadriênio”, diz.
O que observar
A formação de um cenário de incerteza global e alta de custos tem levado o Banco Central brasileiro a assumir uma postura mais dura no combate da inflação, mesmo que afetando o ritmo da atividade econômica. Segundo José Alves Trigo, cientista político e professor de Jornalismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie, a perspectiva é de que o índice inflacionário retome sua tendência de viés de elevação, já que tivemos recentemente uma deflação artificial.
“Embora o Banco Central trabalhe com a previsão de cerca de 5,4%, a tendência é de que a inflação beire a casa dos 7% em 2023 e 5% em 2024. O câmbio depende muito da nova política econômica que deve ser implantada. Uma reaproximação do Brasil com os países interessados em investir pode fazer com o que a relação real x dólar atinja níveis abaixo de R$ 5 e mais próximos de R$ 4,50, que são os níveis pré-pandemia”, analisa.
Desafios a serem enfrentados
Enfrentar problemas que têm dimensões por vezes contraditórias, como por exemplo, manter o equilíbrio fiscal e delinear políticas públicas eficazes e eficientes para, na dimensão conjuntural, combater dilemas agudos de miserabilidade e, no plano estrutural, colocar em práticas políticas e investimentos na área de educação, colocando país em cenários globais mais competitivos.
Nesse cenário, o combate e a vitória sobre à fome endêmica e ao desemprego poderão indicar que país voltou a ser emergente e capaz de obter ganhos, em cenários tão conturbados.
Soluções para entraves históricos
O governo eleito precisará estar conectado com a realidade, segundo a qual, somente poderá ser eficiente em suas políticas e decisões, se preservar os princípios estratégicos da macroeconomia, conquista das últimas duas décadas, controlar os gastos públicos e gerir com o máximo de rigor o orçamento da União. Não pode ceder às pressões de sindicatos e setores burocráticos e improdutivos. Objetivamente construir uma agenda de projetos e tomar decisões distantes do modelo populista de gestão.
Fonte: Sidney Leite, professor de relações internacionais coordenador de ensino da ibs americas – considerada a maior escola internacional de negócios do Brasil.
E por falar em ritmo, segundo Josilmar Cordenonssi, docente de Ciências Econômicas do Centro de Ciências Sociais e Aplicadas (CCSA) da Universi- dade Presbiteriana Mackenzie (UPM), com a recuperação da fase mais aguda da pandemia de Covid-19, o Brasil volta a se deparar com o nosso principal obstáculo: o crescimento econômico. “Parece que não conseguimos mais nem ter o chamado ‘voo de galinha’ que era uma rápida recuperação após algum período de recessão”, afirma.
O Coordenador do Instituto de Finanças, Ahmed Sameer El Khatib, avalia que apesar das riquezas produzidas no setor agrícola, infelizmente o Brasil não tem grande capacidade de dar início a um ciclo de crescimento que se autoalimenta. “Seria necessária a criação de um modelo autossustentável de crescimento ou de crescimento orgânico, pois o Brasil precisa crescer e se desenvolver em várias áreas”, frisa.
Adriana Dupita, da Bloomberg Economics. (Foto: Reprodução/Mackenzie)
Complexidade
Adriana Dupita, economista-chefe Brasil e Argentina na Bloomberg Economics, indica que Brasil já enfrentaria 2023 desafiador para suas próprias questões domésticas – mas as dificuldades no contexto global tornam a situação ainda mais complexa.
“O novo mandato presidencial começará com difíceis decisões fiscais: prorrogar ou deixar expirar os cortes temporários de impostos introduzidos em 2022; se deve manter ou não e, em caso afirmativo, como financiar, maiores transferências sociais para famílias de baixa renda que enfrentam custos crescentes de alimentos; e, sobretudo, como desenhar e aprovar uma regra fiscal crível que assegure solvência a médio prazo ao mesmo tempo que permita alguma flexibilidade à despesa pública”, diz.
Segundo a analista, todos esses desafios são agravados por uma inflação resiliente e disseminada – que exige altas taxas de juros – em meio a um longo período de baixo crescimento. “Fazer tudo isso em meio a condições globais cada vez mais apertadas e um crescimento global em declínio exigirá um esforço extraordinário para elaborar, comunicar e executar as mudanças estruturais que o país precisa – nas frentes fiscal, de produtividade e ambiental. Exigirá também habilidades políticas excepcionais para obter uma rápida aprovação no Congresso e senso de urgência para eleger as prioridades corretas”, analisa.
Infraestrutura ainda crítica
De acordo com Antonio Wrobleski, os maiores desafios a serem enfrentados na próxima gestão são a total falta de infraestrutura, tanto na área de transportes quanto na área de saúde e educação. “Se as soluções para os entraves, que são históricos, não forem iniciadas efetivamente, nós vamos passar décadas piorando e com poucas alternativas para voltarmos a fazer o país crescer no ritmo de pelo menos 4% ao ano.
Para Leonardo Leão, advogado especialista em Direito Internacional e CEO consultor de imigração e negócios internacionais da Leão Group, o crescimento econômico é um dos pontos de atenção para as próximas lideranças.
“A próxima gestão vai assumir um país ainda bem combalido pela pandemia, atividade empresarial ainda muito reduzida, com sinais de crescimento, mas um crescimento ainda muito modesto. O PIB do Brasil será um pouco maior do que os especialistas pessimistas previam, com crescimento ainda lento perto de outros países”.