Roberto Campos Neto: 'Em perspectiva global, o Brasil é sério candidato a ser um dos maiores beneficiados com o novo cenário global'

Roberto Campos Neto deve ficar na presidência do Banco Central até 2024 e, tal como seu avô, um dos principais idealizadores da instituição, mantém olhar voltado para o futuro.

Créditos_ Vanessa Carvalho_LIDE(20)Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central. (Foto: LIDE)

“Debate-se muito no mundo, hoje, o que é a tecnologia, o que ela faz com as pessoas e as sociedades, e que relação tem com essa complicada condição que se chama ‘modernidade’”, escreveu, aos 82 anos, o economista e diplomata Roberto Campos em artigo para a Folha de S. Paulo, de novembro de 1999.

A reflexão feita pelo homem que já havia sido deputado federal, senador e ministro do planejamento do governo Castello Branco recai nos dias de hoje sobre sua descendência, mas especificamente o atual presidente do Banco Central do Brasil (BC), Roberto Campos Neto. Entusiasta da tecnologia, com mestrado em inova - ção pela Singularity University, na Califórnia, Campos Neto anunciou o Pix em novembro de 2020, consolidando-o como o meio de pagamento mais utilizado no país.

Criado para atender a uma série de objetivos públicos, a ferramenta é reconhecida como um caso de sucesso mundial. Além de alavancar a inclusão financeira, o modelo amplia a digitalização dos pagamentos e pro - move a competitividade e a eficiência no mercado.

Controle

Campos Neto seguiu os passos do avô, e virou economista. Após uma bem-sucedida carreira de mais de duas décadas no mercado financeiro, sendo a maior parte no Santander, hoje comanda a maior institui ção monetária do país, cujo pai de seu pai ajudou a idealizar. E, atualmente, atua para que a instituição consiga maior autonomia.

Em fevereiro de 2022, foi sancionada pela presidência da República uma lei que prevê mandato fixo de quatro anos para o presidente e os diretores da instituição, com o objetivo de blindar o órgão contra pressões político-partidárias. Além disso, o BC, antes vinculado ao Ministério da Economia, passou a ser uma autarquia de natureza especial, caracterizada pela ausência de ligação com qualquer Ministério. Mas a independência conquistada ainda não é a sonhada por Campos Neto.

Em 1964, a Lei 4.595 dava ao banco autonomia operacional, administrativa e financeira, inclusive com mandatos fixos para a presidência e a direção. No entanto, ela durou somente até 1967. Atualmente, a instituição possui autonomia operacional, mas não tem independência administrativa e financeira. Isso significa que o órgão não pode, por exemplo, definir aumento salarial de servidores, pois a decisão é tomada na realização do orçamento do governo federal. Essa particularidade se tornou evidente em abril deste ano quando os funcionários da instituição entraram em greve por reajustes salariais.

Ponderação

Recentemente, Campos Neto, que deve ficar no cargo até 2024, passou seu recado ao presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva. “Em perspectiva global, o Brasil é sério candidato a ser um dos maiores beneficiados com o novo cenário global. Temos um mercado de trabalho grande, um mercado consumidor enorme e somos um dos únicos países nas Américas capaz de produzir energia renovável em grande quantidade”, disse.

Ainda segundo o presidente do BC, o país deveria “evitar um aumento de impostos desequilibrado e lembrar que sobrecarregar demais impostos em capital contribui para uma diminuição na produtividade”. O economista afirma que esse é um problema global e que é necessário “um conjunto de políticas que olhe o social, mas que nos dê credibilidade para atrair investimentos externos e estimular o empreendedor brasileiro a apostar no crescimento do seu negócio.” Para a liderança, os governos mundiais estão acomodados.

“Se olharmos o gráfico de reformas no mundo desenvolvido versus produtividade, verificamos que, pela primeira vez na história, a produtividade é tão baixa e temos tão poucas reformas”, disse. Para o economista, rachaduras começam a aparecer no mundo com a falta de produtividade, que já dura há quase dez anos. “Temos uma demografia que deixou de ser um fator positivo, uma quebra de cadeias globais que, na verdade, vem desde 2008 e se acelerou mais recentemente, além de uma quebra de cooperação de tecnologia, que foi um fator muito importante também”, afirmou.

 

Fôlego

 

Agora, o próximo desafio de Campos Neto será colocar o Real Digital para funcionar. Chamada de CBDC (do termo inglês Central Bank Digital Currency), os testes com a moeda digital, que segue a tendência mundial de transações on-line, deve ser lançada em 2023. Também está a todo vapor a continuidade da implementação da Agenda BC#, que foi lançada em 2019, e possui cinco pilares: inclusão, competitividade, transparência, educação e sustentabilidade. E como parte do pacote inovações dos planos estão o Pix e o Open Finance Banking (regras para compartilhamento digital de informações financeiras).