Nizan Guanaes: as empresas são velozes e eficientes em captarem as necessidades globais, mas boa parte ainda é pura maquiagem e conversa fiada

O executivo concedeu entrevista exclusiva à Revista Fórum. A trajetória de Guanaes inclui a participação ativam do Fórum Econômico Mundial de Davos e da Clinton Global Initiative, e foi fundador da Women in the World Foundation.

Nizan Guanaes e a covid-19: publicitário se junta aos contaminados pela  segunda ou terceira vez | Lu Lacerda | iG

O CEO da N Ideas é considerado um dos principais e mais hábeis estrategistas da comunicação. (Foto: Reprodução)

 

Embaixador Global da Unesco, investidor em série, presidente do LIDE Tendências, pai, marido e avô. Nizan Guanaes vai além desses adjetivos, ressignificando o life style brasileiro promovido pelos executivos e empresários de sucesso que fogem das amarras das metas corporativas.

Um dos cinco brasileiros mais influentes do mundo, segundo o Financial Times, Guanaes foi eleito também um dos empreendedores mais criativos do planeta pela revista americana Fast Company. Com personalidade forte, ele revolucionou a propaganda brasileira com a lendária DM9, na década de 1990, a partir da qual surgiram conceitos inovadores, incluindo o famoso slogan de uma das rádios de notícias do país. Nos anos 2000, com a Africa, redesenhou o modelo de agência de publicidade, tendo sido pioneiro na primeira grande holding de propaganda e marketing do país e colocando o Grupo ABC entre os 20 maiores do mundo. A venda da DM9, anunciada pelo New York Times, e o deal do Grupo ABC com a Omnicom foram as duas maiores transações do mercado publicitário brasileiro, consagrando Nizan como grande empreendedor.

Maratonista e triatleta, o profissional voltou a estudar em Harvard e em instituições renomadas internacionalmente, atitude que objetiva demonstrar apoio ao empreendedorismo social brasileiro e investimento em diversas startups.

O incansável estrategista da N ideias, consultoria das principais companhias brasileiras, como Itaú, Marfrig, Ânima, Suzano, Magalu e JHSF, o empresário concedeu entrevista exclusiva para a Revista Fórum, em que reflete sobre o novo momento do marketing e da comunicação vividos pelas grandes empresas, com um panorama real da disrupção tecnológica e o potencial inquestionável do ESG quando aplicado com verdade e sabedoria.

Revista Fórum: As lideranças compreenderam que precisam se atentar ao imponderável, a mudanças radicais como uma pandemia, catástrofes climáticas ou baques socioeconômicos, tendo em vista do grande impacto desses eventos nos negócios?

Nizan Guanaes: Percebo que antes da pandemia, as empresas estavam acostumadas a certa linearidade, mas agora a volatilidade é o normal do mundo moderno. Acontece que os profissionais se habituaram tanto com a zona de conforto, que, quando eles são praticamente forçados a sair dela, acabam sofrendo um grande impacto. Acabou de acontecer com a guerra entre Rússia e Ucrânia, por exemplo, isso logo depois da pandemia da Covid-19. Estou citando coisas negativas, no entanto, outra série de acontecimentos positivos também podem nos tirar dessa zona de conforto. O que as empresas precisam é se acostumar com a gestão do novo, é conseguir dar a resposta em pouquíssimo tempo. Mesmo se você acertar, mas levar meses e meses para responder, a resposta poderá estar errada.


De que maneira a atual transformação digital e social têm impac- tado a rotina do CMO e de suas equipes nas mais diferentes áreas? O que mudou efetivamente na comunicação ou deve mudar?

As redes sociais são avanços espetaculares, mas elas trouxeram constante problema de PR (Public Relations) para as empresas, uma simples palavra pode criar um enorme problema em 24 horas. Nesse ponto de vista, as organizações precisam estar constantemente de prontidão. Isso é o mundo como ele é hoje, o que aconteceu é que boa parte das companhias estão centradas no processo de pesquisa, e consequentemente acabou fazendo com que a propaganda ficasse chatíssima. Não é falta de criatividade, mas temos escassez de comerciais inspiradores na televisão, exemplifico, pois atualmente, os protocolos criativos são feitos para não errar. Artistas não fazem pesquisa, eles sentem e ouvem a população, não são indiferentes, mas conseguem entregar o novo justamente por entenderem isso.

Neste novo ambiente de negócios, as empresas te procuram em busca de um risco maior, por mais ousadia e inovação nas ações?

Exatamente, não trabalho com status quo, sou uma churrascaria, não aceito vegetariano. A estratégia é tirar do oceano vermelho para o oceano azul, isso que a ela faz, o lugar comum é o engarrafamento. E a estratégia é encontrar um caminho só seu e esse mesmo caminho implica nas escolhas em ser diferente. Se você olhar as coisas que estão ‘disruptando’ no mundo, elas são simplesmente obvias depois do resultado pronto. Então, fica a nossa pergunta de sempre: ‘como não pensaram nisso antes?’ e a resposta nos leva novamente para o problema da zona de conforto.

Questões como ESG estão muito presentes hoje na pauta das empresas. Será que essas lideranças estão sabendo comunicar essas ações corretamente?

As empresas são muito velozes e eficientes em captarem as necessidades do mundo. Muitas delas estão vivendo o ESG profundamente, mas boa parte ainda é pura maquiagem e conversa fiada. Essa questão é preocupante, considerando que o planeta ruma para a catástrofe. Essa história de dizer que os problemas devem aparecer lá na frente é bobagem, pois vemos aqui no Brasil chuvas em excesso e desertificação em determinadas regiões, tudo isso com intensidade e brutalidade. O ESG é um caminho sem volta. Quem investir nesses pilares terá oportunidade competitiva, vide que a sustentabilidade é uma demanda do consumidor, embora este também pode se tornar hipócrita frente a esse discurso.

Você viveu e foi um dos nomes da época áurea da publicidade. O que as agências atuais perdem ou ganham com estruturas mais enxutas e o trabalho remoto, ou seja, um novo modelo de trabalho?

O que só não vi com essa nova visão são coisas incríveis sendo produzidas na TV, rádio e internet. Novas formas de fazer, mais humanas e colaborativas são sempre bem-vindas. Entretanto, as agências, muitas vezes, não conseguem atuar assim, pois estão montadas em uma base brutal de custos. Os clientes também decidiram pagar pouquíssimo, algo que, para mim, é péssimo. A publicidade saiu do C-level, da interlocução direta com dono como no passado, que sempre produziu coisas melhores.

Estruturas menores e mais ágeis ajudam, isso é tendência global, porém, acredito que o futuro da propaganda está na estratégia. Antigamente se dizia que a ‘propaganda é a alma do negócio’ , hoje, afirmo com absoluta certeza, que o futuro está na estratégia e depois vem a propaganda, ou uma embalagem, uma assessoria de imprensa ou até ficar calado.

 

Nizan Guanaes entre Davi e Golias - NeoFeed

Ainda durante a conversa, publicitário falou sobre as expectativas futuras para vários segmentos do mercado empresarial. (Foto: Divulgação)


Você percebe algum gargalo no ecossistema empreendedor ou na formação de jovens lideranças na propaganda?

Invisto em startups e empresas como a Trybe, Mottu e Dr. Consulta e sinto que na iniciativa privada como num todo existe muito mais inventividade que no campo da publicidade e da comunicação. A indústria da propaganda precisa ser criativa também na gestão, mas está obsoleta. Inclusive, não me sinto mais publicitário, e não tem nenhum demérito nisso. Enxergamos as coisas com certa facilidade na indústria dos outros, mas não na nossa. A N Ideias é justamente uma empresa que tem revolucionado a propaganda por ter compreendido que é necessário manter a alma, mas em um novo corpo. O que a empresa me permite é não ter uma base de custos e poder dizer não, assim eu só jogo no ataque e uso o meu tempo em benefício dos meus clientes. O que hoje em dia não acontece na indústria da propaganda, as pessoas não tem tempo para se atualizar e, ao longo da vida, todos terão muitas carreiras. O sucesso da N Ideias acontece por esse meu contato direto com CMO e com a alta direção das empresas, permitindo uma interlocução de alta qualidade e velocidade.

Quais operações e setores tradicionais ainda tem espaço para crescer e avançar no país?

Medicina e agro são segmentos importantíssimo e promissores. Educação é outra área com potencial, sobretudo Lifelong Learning e EAD, conceitos que estão sendo formatados. É preciso olhar também para as novas formas de consumidor e para a economia verde. No contexto tecnologia, hoje meu mantra é: metaverso, metaverso, metaverso, blockchain, blockchain, blockchain, NFT, NFT, NFT e, definitivamente, programação e gestão da informação.