“Mercados que se recuperarão primeiro serão os que têm mais ligação com tecnologia”, avalia Fernanda Consorte
Economista e estrategista de câmbio do Banco Ourinvest acredita que o momento não será homogêneo. Especialistas alertam ainda para o papel do governo que, por meio de políticas públicas assertivas, será imprescindível para uma recuperação econômica mais rápida.
Fernanda Consorte: “Não teremos um movimento muito homogêneo". (Foto: Divulgação)
No último relatório Perspectivas Econômicas Mundiais divulgado no início desse ano, o Banco Mundial apontou que a economia global deverá crescer aproximadamente 4%, em 2021, se houver uma vacinação de massa efetiva e políticas públicas que incentivem a retomada dos investimentos. Para o banco, caso a cobertura vacinal atrase poderá haver limitação do crescimento em até 1,6%, por outro lado, se a campanha global for exitosa, a expansão econômica poderia chegar a 6%.
A relação entre a velocidade da imunização e a recuperação da economia é apontada por muitos economistas mundo afora como crucial. De acordo com o pesquisador associado do FGV IBRE, Cláudio Considera, só há uma forma de fazer a economia voltar a crescer: vacinação em massa. “A vacinação permite que as pessoas voltem a se encontrar. Sem isso a economia não irá retomar seu crescimento no Brasil”, avalia.
O setor de serviços, que atualmente representa 74% do PIB nacional, é o mais impactado da crise provocada pelo novo coronavírus e, consequente, pelo distanciamento social. “Quando acontece algo como a que houve no ano passado, e persiste até hoje, o setor de serviços é fortemente atingido, pois é totalmente dependente de contato social - no comércio, teatro, cinema, restaurante. Podemos dizer que a pandemia no Brasil deu uma pancada em um único setor que garantia o crescimento do país”, explica Cláudio Considera.
Já para a economista e estrategista de câmbio do Banco Ourinvest, Fernanda Consorte, a relação entre a vacinação e a retomada econômica é real. “A expansão da imunização permitirá à economia ganhar tração ”, afirma.
Consorte aposta, entretanto, que haverá uma recuperação bastante desigual entre os segmentos da economia. Em seu relatório, o Banco Mundial também avalia que o setor de serviços se recuperará mais lentamente do que o industrial no Brasil, em razão da aversão ao risco persistente entre os consumidores. “Não teremos um movimento muito homogêneo. Os mercados que se recuperarão primeiro serão os que têm mais ligação com tecnologia”, diz a economista do Ourinvest.
Alternativas
Exemplo disso é a Ituran Brasil, empresa líder global de monitoramento veicular, cuja atuação é voltada à inovação. Em 2020, a companhia conseguiu um resultado positivo e espera crescer 15% esse ano.
“Nossos produtos para varejo são uma alternativa para quem teve diminuição na renda. Para o setor corporativo, temos soluções que ajudam as empresas a diminuir custos de combustível e manutenção, o que é de extrema importância principalmente nesse contexto atual”, comenta Amit Louzon, CEO da Ituran Brasil.
Amit Louzon, CEO da Ituran Brasil: ainda estaremos em crise em 2021. (Foto: Divulgação)
Louzon explica que a Ituran trabalha com dois cenários possíveis para esse ano no Brasil: um mais moderado e outro mais otimista. O moderado é que até o final do ano o país já tenha atingido a vacinação em massa e a curva de infectados pela Covid-19 comece a decrescer.
“Durante 2021, ainda estaremos em crise econômica. Os clientes de seguro continuarão procurando produtos com o melhor custo-benefício. Por outro lado, o mercado de frotas está crescendo vigorosamente, principalmente no semento da locação e assinatura de carro. A Ituran também tem soluções de telemetria para gestão das frotas. Em 2020, batemos um recorde de instalações no segmento e em 2021 essa tendência continuará”, afirma.
Cláudio Considera avalia que não bastam as aprovações das reformas para que o ambiente se torne favorável ao crescimento econômico, mas que também será necessário investimento público para fomentar a retomada da atividade econômica. “Nós temos que nos convencer de uma coisa: não existe crescimento espontâneo. O país não vai crescer de forma espontânea. Faz-se a reforma e pronto, o país cresce. Isso não vai acontecer. Vai ter que ter ação do governo para a economia crescer de forma vigorosa, como o investimento em obras públicas ou de saneamento básico, por exemplo”, afirma.
O investimento público tem a capacidade de ligar o motor da economia mais rapidamente e criar um impacto positivo em vários elos da cadeia produtiva no Brasil. O problema é que o país também enfrenta um enorme desafio fiscal, o que deixa sua capacidade de investimento público limitada. E esse não é um problema apenas brasileiro. David Malpass, presidente do Banco Mundial, lembra que embora a economia global dê indícios de uma recuperação moderada, os governos dos países têm desafios tremendos em termos de saúde pública, gestão da dívida, políticas orçamentárias, banco central e reformas estruturais.
“Para superar os impactos da pandemia e contrabalançar os ventos contrários do investimento é necessário um grande impulso para melhorar o ambiente de negócios, aumentar a flexibilidade do mercado de trabalho e de produtos, e fortalecer a transparência e a governança”, afirma Malpass.
Perspectivas
Para o Brasil, a avaliação do Banco Mundial é de que a confiança em alta do consumidor e as condições de crédito atraentes devem apoiar a recuperação do investimento e consumo privado, fomentando um crescimento de aproximadamente 3% do PIB em 2021. Fernanda Consorte discorda da projeção feita pelo Banco Mundial. Para ela, embora o mercado preveja um crescimento na ordem de 3% ou 3,5%, esse é um número muito difícil de ser alcançado em 2021. “Há vários motivos. O primeiro deles é a pandemia, que ainda não está controlada. Essa segunda onda fez com que medidas de restrição mais duras fossem tomadas pelos governos, que serão suficientes para que vejamos um desempenho econômico ruim ainda no primeiro trimestre. Se de fato estávamos tendo alguma recuperação a partir do terceiro e quarto trimestres do ano passado, que na minha opinião foi fraca, no primeiro trimestre desse ano isso vai ter uma desaceleração”, afirma Fernanda.
O papel do agro
Já há alguns anos o Brasil vem sofrendo uma forte desindustrialização que colocou o agronegócio em ainda mais destaque no país. Chamado de “celeiro do mundo”, o segmento vem batendo recordes e para 2021 a expectativa não é diferente.
Chamado de “celeiro do mundo”, o segmento vem batendo recordes. (Foto: Agência Brasil)
De acordo com o professor da Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado (FECAP), José Luiz Tejon Megido, a pandemia propiciou a busca por mais segurança alimentar em muitas nações. O medo do desabastecimento, fomentou a busca por estoques de segurança. "Quem tem matérias-primas para vender encontra nesse ano um ótimo campo para superar resultados econômicos e financeiros. E o Brasil tem commodities para vender. Enquanto o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos acaba de divulgar seu mais novo relatório de oferta e demanda de produtos agrícolas, reduzindo a estimativa de produção global de soja de 362,05 milhões para 361 milhões de toneladas, no Brasil teremos uma safra recorde", destaca.
Geração de energia alternativa e novos emprego
O Fórum Econômico Mundial, em parceria com a Accenture, divulgou em fevereiro uma nova análise em várias regiões, explorando o caminho das concessionárias em meio à pandemia de Covid-19 em curso e as oportunidades para acelerar o crescimento econômico e a transição para energia limpa. Um Grupo de Ação da Indústria que incluiu mais de 25 empresas de serviços públicos globais e empresas de tecnologia de energia buscou avaliar de forma holística os resultados econômicos, ambientais, sociais, bem como desdobramentos técnicos de potenciais soluções de energia.
A análise revelou que no Brasil, nos próximos cinco anos, os investimentos da indústria de energia alternativa – como a solar e a eólica - e o impacto da digitalização das cidades para um modelo mais inteligente e eficiente podem gerar mais que 1,2 milhão de novos empregos e reduzir em 28 toneladas a emissão de CO².
Na análise, foram mapeados diversos elementos da cadeia de valor do setor elétrico no País, como emissão de gás carbônico, pegadas d’água, acesso a eletricidade, qualidade do ar, resiliência e segurança do setor, qualidade de serviços e flexibilidade. No entanto, foram aspectos como impactos no emprego e na economia, eficiência do setor e produtividade, investimento estrangeiro, atualização de sistemas e competitividade que se destacaram no cenário nacional.
Com o mapeamento do setor elétrico brasileiro, foi possível identificar um modelo que pode direcionar a transformação e atualização do País em termos de energia, utilizando sua grande fonte de energia hidrelétrica como alicerce para sustentar a população enquanto investimentos em fontes alternativas de energia ganham força, como a solar e a eólica, bem como o investimento em cidades integradas e inteligentes.
O relatório traz, ainda, que a demanda por energia no País deve triplicar até 2050, o que fortalece a necessidade de investimentos no setor. Para isso, o Brasil deve precisar de ao menos 38 novas linhas de distribuição de energia com mais de 5 mil quilômetros de extensão, o que significa um investimento de mais de R$ 10 bilhões.