Robson Braga de Andrade: Reversão da desindustrialização é crucial para o Brasil crescer de forma sustentável
Desde a década de 1990, Brasil tem sofrido processo de desindustrialização, que se agravou nos últimos dez anos.
Robson Braga de Andrade é presidente da CNIPresidente da CNI desde 2010. (Foto: Divulgação/Agência de Notícias da Indústria)
Em meados da década de 1980, o setor industrial chegou a ser responsável por quase metade do PIB brasileiro. A expansão do setor foi resultado da adoção de políticas públicas que incentivaram investimentos do governo e da iniciativa privada em setores estratégicos, como energia, transportes, comunicação, siderurgia, mineração e petróleo, entre outros. Tais políticas foram decisivas para o crescimento e a consolidação do parque industrial brasileiro que, atualmente, está entre os mais modernos e diversificados do mundo.
Desde a década de 1990, entretanto, o Brasil tem sofrido um preocupante processo de desindustrialização, que se agravou severamente nos últimos dez anos. A indústria de transformação, que em 1985 representava 36% do PIB, terminou o ano de 2021 com apenas 11% de participação na produção nacional. Mais grave ainda foi a queda da participação da indústria brasileira na produção mundial. Em 1995, nossa indústria manufatureira representava 2,77% da produção mundial, percentual que hoje é de apenas 1,28% – ou seja, praticamente a metade –, como mostra recente estudo elaborado pela CNI.
A desindustrialização é danosa para toda a economia brasileira, sobretudo devido à capacidade que o setor tem de multiplicar riquezas. A cada R$ 1,00 produzido na indústria de transformação, são gerados R$ 2,43 na economia como um todo. A título de comparação, na agricultura são gerados R$ 1,75 e nos setores de comércio e serviços, R$ 1,49. O setor industrial tem a capacidade de puxar o crescimento dos demais setores por possuir cadeias produtivas longas e ser o grande indutor de inovações da economia. Mesmo a revolução de telecomunicações, que afetou profundamente o setor de serviços, dependeu da criação de produtos industriais, como smartphones, sensores, torres de transmissão, entre outros.
A alta produtividade e a produção em larga escala da agropecuária nacional, deve-se também, em grande medida, aos insumos fornecidos pela indústria, tais como ferramentas, máquinas e equipamentos com grande conteúdo tecnológico; rações para animais; sementes, fertilizantes e defensivos.
As causas da perda de competitividade da indústria nacional são muitas. Destacam-se, entre elas, os elevados custos sistêmicos, conhecidos como Custo Brasil, além da ausência de uma estratégia de desenvolvimento industrial. O Custo Brasil – que, como divulgado pelo Ministério da Economia, consome 1,5 trilhão de reais anualmente das empresas –, é resultado de diversos problemas, como o sistema tributário complexo, oneroso e cumulativo; a infraestrutura deficiente; o financiamento escasso e caro; a baixa qualidade da educação; o ambiente macroeconômico instável; e a insegurança jurídica.
Estes custos são mais elevados para as empresas que produzem no Brasil, em comparação com aqueles suportados pelas empresas dos nossos principais concorrentes. Eles tornam os produtos brasileiros mais caros, o que se converte em perdas de exportações no mercado internacional e de espaço para produtos importados no mercado doméstico. Para eliminar ou, pelo menos, minorar essa dicotomia, uma prioridade urgente é a reforma da tributação sobre o consumo. A Proposta de Emenda à Constituição 110/2019, em discussão no Senado, contempla as principais demandas do setor produtivo nessa área, entre elas a eliminação da cumulatividade e a imediata recuperação dos créditos tributários devidos. A consolidação da tributação indireta é imprescindível para acabar com as distorções do sistema tributário atual, que levam à perda de competividade e de eficiência, não apenas da indústria, mas de toda a economia brasileira.
Outra medida essencial é a recuperação da capacidade de investimento em infraestrutura. O aumento de investimentos em transportes, energia, saneamento e telecomunicações garantiriam reduções de custo significativas para as empresas, a médio e longo prazos.
Para estancar o processo de desindustrialização e recuperar a competitividade do setor, é imperativo não apenas superar os gargalos antigos relacionados ao Custo Brasil, mas também que o país invista na adoção de uma política industrial moderna, alinhada com as melhores práticas internacionais. Novas estratégias de desenvolvimento industrial têm sido o grande foco de países como Estados Unidos, Japão, Coreia do Sul, China, Alemanha e demais países da União Europeia. Um levantamento realizado pela CNI sobre os ambiciosos planos destes países nesta área revela que, juntos, eles preveem investimentos da ordem de 5 trilhões de dólares, nos próximos anos, em políticas de apoio às suas respectivas indústrias, com vistas a alcançar objetivos estratégicos, como a digitalização e a descarbonização da economia.
Um dos principais objetivos de uma política industrial moderna é o desenvolvimento científico e tecnológico, que coloca a inovação como principal fonte de ganhos de produtividade e de competitividade. Nos Estados Unidos, os investimentos em pesquisa e desenvolvimento (P&D) correspondiam, em 2018, a 2,83% do PIB. No mesmo ano, a China investiu 2,14% do PIB e a Coreia do Sul chegou a 4,53%. Na contramão do mundo, o Brasil vem reduzindo seu investimento em P&D e, hoje, investe apenas 1,2% do PIB.
Será essencial que o candidato que sair vitorioso nas eleições de 30 de outubro, qualquer que seja ele, tenha como prioridades de governo reduzir o Custo Brasil e apoiar firmemente a indústria brasileira no desenvolvimento de técnicas de manufatura avançada e na incorporação de tecnologias da Indústria 4.0, que permitem ganhos de produtividade significativos para as empresas. É urgente, também, que o país aproveite as janelas de oportunidades abertas na área de meio ambiente, em função das mudanças climáticas, investindo em tecnologias que permitam a transição para uma economia de baixo carbono, com políticas destinadas à transição energética e à economia circular.
A política de desenvolvimento industrial deve ser estruturada com a garantia de recursos orçamentários e com uma ampla capacitação de recursos humanos para sua implementação. Um de seus principais pilares deve ser o financiamento direcionado, com juros competitivos, para inovação, exportação e economia de baixo carbono. No mundo, as linhas de financiamento que sustentam esses investimentos são majoritariamente públicas, dada a sua importância estratégica. Ela também precisa, necessariamente, ser construída com foco no longo prazo – o que requer previsibilidade, estabilidade e segurança jurídica, fatores essenciais para sustentar as decisões de investimento do setor privado.
A reversão da acelerada e precoce desindustrialização em curso no Brasil é crucial para que o país retome a trilha do crescimento econômico, de forma sustentável. E este objetivo só será alcançado com a adoção de medidas que garantam às indústrias nacionais igualdade de condições frente à acirrada competição do mercado internacional, com a eliminação do Custo Brasil e com políticas de apoio à indústria similares às implementadas pelos nossos competidores. A premissa básica é que não existe país forte e desenvolvido sem uma indústria dinâmica, competitiva e integrada ao mercado global.
*Robson Braga de Andrade é empresário e presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI).
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Fonte: Agência de Notícias da Indústria