Melhoramos no rating da S&P, mas estamos melhor?
Murillo Torelli, professor de Contabilidade Financeira e Tributária no Centro de Ciências Sociais e Aplicadas (CCSA) da Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM). (Foto: Divulgação)
A recente revisão da perspectiva de rating BB- para positiva, feita pela agência de classificação de risco S&P Global, tem gerado discussões sobre a possível recuperação do grau de investimento do Brasil. No entanto, é necessário questionar se essa mudança representa de fato um retorno à trilha da estabilidade econômica ou se é apenas mais um voo de galinha do governo, perdido em suas ações e sem um projeto coerente.
O grau de investimento é um selo de bom pagador, um indicador de que um país possui capacidade de honrar seus compromissos financeiros. Isso atrai investidores e permite que o país tenha acesso a empréstimos com taxas de juros mais baixas. No entanto, é irônico pensar que estamos melhorando o grau de bom pagador dos empréstimos tomados, enquanto estamos emprestando dinheiro para países da América do Sul (que muitas vezes não nos pagam), poderia ser considerado uma ação bondosa ou poderia dar um grau de bom emprestador?
Vale ressaltar que o Brasil já conquistou o grau de investimento no passado, durante o governo de Lula em 2008. Naquela época, a S&P, a Fitch e a Moody's concederam o upgrade no rating brasileiro. No entanto, a situação mudou drasticamente durante o governo de Dilma Rousseff, quando as contas públicas se deterioraram e o grau de investimento foi perdido. A S&P rebaixou o rating do Brasil para BB+, com perspectiva negativa.
Desde então, o país tem lutado para se recuperar e reconquistar o grau de investimento. No entanto, o atual governo liderado por Lula parece estar repetindo os mesmos erros do passado e demonstra uma falta de comprometimento com a responsabilidade fiscal e a estabilidade econômica. Suas ações têm sido marcadas por decisões questionáveis e uma falta de transparência que mina a confiança dos investidores.
Um exemplo claro é a mudança no CARF (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais) por meio de uma medida provisória, sem qualquer aviso prévio. Essa ação unilateral do governo para garantir a volta do chamado voto de qualidade nos julgamentos do conselho, que havia sido eliminado anteriormente, demonstra uma falta de respeito pela transparência e pelo devido processo legal.
Além disso, o governo tem buscado acordos no STF (Supremo Tribunal Federal) em detrimento do diálogo com o Parlamento. Ao contornar os representantes do povo, o Executivo demonstra uma falta de habilidade política e uma desconsideração pelas instituições democráticas. Essa postura fragiliza a estabilidade política e prejudica a confiança dos investidores.
Outro exemplo de retrocesso é a mudança no marco do saneamento, ignorando a opinião de parlamentares que aprovaram recentemente a legislação. Essa atitude revisionista, promovida pelo governo de Lula e seus ministros, mostra uma falta de compromisso com a continuidade das políticas públicas e afasta potenciais investidores que buscam segurança jurídica e estabilidade regulatória.
A indicação de Gabriel Galípolo para o Banco Central sem qualquer aviso prévio ao Senado é outro exemplo de falta de transparência e de uma estratégia clara. Essa falha de comunicação resultará em atrasos no processo de sabatina e demonstra uma falta de coordenação e planejamento adequados.
O governo também tem buscado a interferência indevida em setores estratégicos, como o caso da Eletrobras, em que busca reclamar que está sub representado na empresa. Essa iniciativa é vista como um retrocesso pelos parlamentares e alimenta especulações de que o governo busca reestatizar a companhia, o que afasta investidores que buscam um ambiente de livre concorrência e segurança jurídica.
Além disso, o governo baixou uma medida provisória, sem qualquer sinalização prévia, taxando investidores no exterior como forma de compensar a isenção no Imposto de Renda para rendimentos de até R$ 2 mil. Essa falta de previsibilidade e clareza nas ações governamentais prejudica a confiança dos investidores e cria incertezas sobre o ambiente de negócios no país.
Por fim, o gerenciamento inadequado do preço dos combustíveis pela Petrobras tem sido motivo de preocupação. A interferência política nesse setor estratégico gera instabilidade e afasta investidores, que buscam um ambiente de livre mercado e de respeito aos princípios da economia de mercado.
Diante desses exemplos de ações questionáveis e falhas de governança, é compreensível que exista um ceticismo em relação à real recuperação do grau de investimento do Brasil. O governo precisa demonstrar uma visão clara, um projeto consistente e um compromisso real com as reformas estruturais, a responsabilidade fiscal e a estabilidade econômica. A confiança dos investidores não será conquistada apenas com revisões positivas de agências de rating, mas sim com medidas concretas, uma postura transparente e uma atuação responsável em prol do desenvolvimento econômico do país.
Enquanto o governo não apresentar uma verdadeira mudança de rumo, com uma agenda clara de reformas e uma postura comprometida com os princípios da economia de mercado, a recuperação do grau de investimento continuará sendo uma miragem distante. O Brasil precisa de um governo que tenha uma visão de longo prazo, que seja capaz de superar interesses políticos imediatos e que esteja disposto a adotar as medidas necessárias, mesmo que impopulares, para promover um ambiente favorável aos negócios, atrair investimentos e impulsionar o desenvolvimento econômico do país.