Artigo: O varejo que emerge da pandemia

A maior transformação foi o avanço do digital em todos os aspectos, das vendas, ao relacionamento, à comunicação, na promoção, na logística, na operação.

Marcos Gouvea Souza Marcos Gouvêa de Souza, fundador e diretor-geral do Grupo GS& Gouvêa de Souza e presidente do LIDE Comércio. (Foto: Divulgação)

Polarizado, mais concentrado e digital, mais competitivo e ainda mais protagonista. Esse é o resumo do varejo que emerge da pandemia no Brasil e no mundo pela convergência de fatores que acelerou tendências e colocou ainda mais poder nas mãos, nos olhos e na voz dos consumidores.

Mais polarizado pois aos dois vetores tradicionais que marcavam a demanda e a oferta do setor – razão e emoção – que determinavam as opções fundamentais de escolha de produtos, marcas, canais e locais de venda, definindo as opções por preço baixo versus experiência e gratificação pessoal, somou-se a conveniência

A conveniência e a facilidade da proximidade de acesso, ou recebimento pela entrega rápida, tornaram-se fatores ainda mais críticos que a pandemia colocou na equação de polarização, reconfigurando o mapa do mercado. E desenvolvendo novos hábitos e demandas que se incorporaram aos novos padrões de comportamento do mercado.

O acaso gerado pela pandemia também acelerou o processo de concentração, com os maiores grupos aumentando participação de mercado e reduzindo a parte das pequenas e médias empresas, pela concentração da oferta de crédito e das condições estruturais para enfrentar as consequências criadas pelo fechamento de lojas e shoppings.

Mas também aumentou o interesse e envolvimento dos fornecedores dos produtos e das marcas para chegarem diretamente aos consumidores, aproveitando o crescimento das alternativas digitais, em especial os marketplaces, que demandam menores investimentos e custos operacionais com lojas.

Porém a maior transformação foi o avanço do digital em todos os aspectos, das vendas, ao relacionamento, à comunicação, na promoção, na logística, na operação. Ou seja, em absolutamente tudo. A forte aceleração na participação das vendas digitais no todo das vendas do varejo, é apenas a ponta do iceberg da enorme mudança estrutural que o setor está passando.

Esse conjunto de fatores elevou ainda mais o nível de concorrência e competitividade que já vinha crescendo no passado, especialmente porque muitos dos novos e antigos players aceleraram investimentos para ocupar espaços privilegiados no mercado nessa verdadeira corrida do ouro que se transformou o novo ambiente gerado pelo digital.

É preciso ocupar e dominar espaços nos bolsos e na mente dos consumidores e para isso pode ser preciso operar até mesmo com prejuízo por algum tempo antes que se possa obter o retorno e o valuation almejado. E isso tudo só fez aumentar o nível competitivo e que não tem volta.

Especialmente no Brasil o período acelerou de forma marcante a reconfiguração da realidade pelo surgimento e expansão dos ecossistemas de negócios liderados pelo varejo tradicional, elemento diferencial relevante em relação ao que acontece em outros mercados mundiais, onde esse modelo de organização foi desenvolvido a partir das empresas nativas no ambiente de tecnologia.

Na lógica dos ecossistemas, quanto maior é, maior fica, o que fez acelerar dramaticamente o processo de fusões, aquisições e incorporações que é marca registrada do período e redesenha todo o cenário do setor.

Semana sim, semana não, uma nova aquisição, parece ter se transformado no mantra para algumas das organizações locais de varejo.

E com tudo isso a expansão do protagonismo do setor se tornou uma realidade ainda mais presente.

Nesse ambiente mais competitivo, concentrado e dominado pelo digital, poder conhecer e monitorar o comportamento dos consumidores, dentro dos preceitos da LGPD, é e sempre foi o elemento natural e fundamental dos negócios de varejo, presente no DNA de todas as organizações que evoluíram nessa atividade e isso só fez aumentar esse protagonismo presente anteriormente.

O varejo que emerge da pandemia é mais maduro, competitivo, digital e protagonista e a evolução da valorização das empresas tradicionais que se reinventaram e as novas que se formaram é apenas o reflexo do aumento do peso econômico, social e político do setor no país.

Toda a complexidade, desafios e dificuldades geradas pela pandemia tiveram papel fundamental na aceleração e transformação estrutural para melhor do setor de varejo.

Eis um legado positivo do período.