"Nosso negócio é extremamente competitivo, não precisamos ter uma agência regulando preço", defende Ricardo Arten
Em entrevista exclusiva, CEO da Brasil Terminal Portuário fala das ações e dos próximos passos da companhia.
CEO da Brasil Terminal Portuário fala dos próximos passos da companhia. (Foto: Divulgação)
A Brasil Terminal Portuário (BTP) nomeou Ricardo Arten como seu novo diretor-presidente (CEO) em maio de 2019. Graduado em engenharia naval pela Universidade de São Paulo (USP), o executivo possui mais de 20 anos de experiência em diversos cargos de liderança no setor portuário, incluindo os portos de Santos, Rio de Janeiro e Itajaí, onde conduziu as unidades de negócios da APM Terminals no Brasil.
Em operação desde 2013, a BTP se consolidou como o maior terminal de contêineres da América do Sul. Localizada no Porto de Santos, em uma área utilizada antigamente como um lixão, a empresa foi responsável pela remediação de um imenso passivo ambiental. Com capacidade de movimentação anual de até 2,5 milhões de TEUs (unidade equivalente a um contêiner de 20 pés), a companhia mantém 1.108 metros de cais, espaço preparado para receber três navios new panamax class simultaneamente. O terminal atende embarcações com rotas para todos os continentes, além de serviços de cabotagem e feeder.
Joint-venture entre a APM Terminals e a TIL, a BTP conta com mais de 1.300 colaboradores diretos e mantém investimentos constantes na expansão de sua capacidade e produtividade operacional. Nesta entrevista, Ricardo Arten destaca que poder comandar um terminal com estratégia e posicionamento consolidados – juntamente com equipe altamente qualificada – é motivo de profundo entusiasmo, além disso, avalia como a empresa tem se posicionado em relação aos principais movimentos do mercado em meio à retomada da economia global.
Revista LIDE: Como a BTP enfrentou os primeiros meses da pandemia do novo coronavírus?
Ricardo Arten: A adaptação foi bastante eficiente, praticamente imediata. Foram necessários somente dois dias para mobilizarmos toda a equipe de colaboradores da área administrativa, cerca de 180 pessoas, que migraram para o regime home office. Claro que a equipe operacional do terminal não parou, já que somos uma atividade essencial, mas implantamos um regime de diferenciado de turnos com o intuito de não gerar aglomerações. Assim que aconteceu toda essa mudança, a equipe comercial da BTP se colocou à disposição de nossos clientes para verificar como poderíamos ajudar e atuar de maneira bastante eficiente nas rotinas e processos de atendimento. Foi algo bem focado, assumimos o compromisso de, apesar desse contexto sem precedentes, ficar mais próximos deles. Além disso, decidimos congelar nossa tabela pública de preços. Assim, o reajuste anual que estava previsto para abril deste ano não aconteceu, os valores permaneceram os mesmos das tarifas aplicadas em 2019, até o momento.
As exportações brasileiras têm crescido exponencialmente, elas já compensam a queda das importações causada pela pandemia?
A exportação realmente tem tido um papel fundamental nesse equilíbrio de ganho e perda em termos de volume no porto. A pandemia parou fábricas em todo o mundo, o que impactou as escalas dos navios. No entanto, poderia ter sido pior, já que a exportação foi a principal responsável por não deixar o porto parar. Nesse período chegamos a colocar escalas extras para poder atender a essa demanda. O terminal depende muito das importações e, logicamente, quando vemos ela cair, precisamos avaliar se as exportações têm condições de fazer essa compensação, e têm feito. A melhor notícia é que não temos mais perspectivas de novos cancelamentos de viagens e setembro foi um mês decisivo para a recuperação dos volumes. A indústria automotiva está retomando a produção das fábricas, temos também o início das festividades do Dia das Crianças e a proximidade do Natal, esse momento já promove um aumento do consumo das famílias, fazendo a economia girar. Além disso, tivemos muitas importações de fertilizantes e pesticidas por parte do agronegócio em decorrência da franca expansão da produção agrícola nacional. Mesmo com essa queda nas importações, os terminais aqui de Santos, não só a BTP, estão operando acima de 75% de utilização.
Existe espaço para os terminais de contêineres começarem a ofertar novos serviços?
No contexto de novos serviços, a BTP já vinha expandindo seu portfólio para continuar atendendo às novas necessidades dos clientes com eficiência e muita segurança. Neste ano, investimos em uma nova área coberta para as operações de DDC (Descarga Direta para Caminhão) que deve encerrar o ano com crescimento de quase 50%. É um ótimo resultado. Investimento também na construção de uma câmara refrigerada que vai permitir para os nossos clientes realizar serviços de inspeção e transferência de cargas sensíveis. São investimentos altos que promovem aumento vertiginoso na produtividade e também permite a tão necessária eficiência logística no nosso país.
A melhora na infraestrutura logística brasileira depende apenas das empresas privadas que atuam no mercado?
Iremos evoluir totalmente só com investimentos federais nos modais, expurgando todos aqueles gargalos, ampliando os acessos ferroviários, aquaviários e rodoviários que a gente já conhece. Acredito que no Porto de Santos seja fundamental a reorganização da área, uma clusterização já prevista no PDC, o qual nós apoiamos. Entendemos que é muito importante a concentração em menos terminais, porém maiores, o que ajuda a garantir a eficiência e cria condições para mais investimentos da iniciativa privada. Temos a oportunidade de oferecer ao armador que Santos seja um Hub Port, um espaço centralizado para que toda a carga nacional possa ser descarregada e depois distribuída. Com isso, é possível colocar navios maiores nas rotas mais longas e navios menores em rotas para fazer a navegação por meio de cabotagem.
Inclusive, qual a importância do Programa de Incentivo à Cabotagem, BR do Mar, para a BTP?
Em linhas gerais a BTP sempre vai ver com bons olhos projetos estruturantes que promovem novos negócios logísticos para o país. A BR do Mar é um bom negócio não só para a BTP, mas para toda a indústria de navegação, incluindo a construção naval que representa um importante marco para tornar o Brasil mais intermodalizado, diminuir o chamado Custo Brasil e ainda ajudar o meio ambiente, considerando que o transporte por navios pode reduzir a quantidade de caminhões nas estradas. Para a BTP e para o Porto de Santos, a promoção da cabotagem tem uma importância muito grande, uma vez que o Porto, com sua localização estratégica, tecnologia e mão de obra qualificada tem vocação para ser o Hub Port que comentei.
Mas não é só a cabotagem, existem outros projetos do Ministério da Economia e da Infraestrutura que também ampliam as fronteiras do desenvolvimento nacional. Se o governo manter este mindset, continuaremos atraindo investimentos estrangeiros e desenvolvendo a economia.
De que maneira a evolução da infraestrutura ferroviária pode beneficiar a operação de portos no Brasil?
Esse é outro modal que, assim como a cabotagem, é muito importante para promover a intermodalidade e reduzir o principal custo da cadeia produtiva que é o transporte da carga, seja para o Porto ou para o mercado interno. Muitas vezes a operação no mercado interno é mais caro que trazer a carga da China até o Brasil, por exemplo. A ferrovia é um modal mais eficiente, mais sustentável, beneficia com ganhos diretos a cadeia logística com redução de custos, tempo, emissão de CO2, sem contar que também alivia o tráfego nas rodovias. O atual governo tem a pretensão de dobrar em até oito anos a malha ferroviária com atração de investimentos, isso é muito importante para o país. Nós da BTP podemos ajudar muito com esse plano, somos um dos maiores terminais da América do Sul, temos papel fundamental para o escoamento dessa carga por ferrovia.
O que tem sido feito no exterior que serve como inspiração e pode ser usado como modelo para o Brasil na área de gestão portuária?
Somos o resultado de uma joint venture entre dois operadores portuários reconhecidos mundialmente, líderes do mercado de movimentação de contêineres. Desta forma, temos muitas fontes inspiradoras para poder olhar lá fora e verificar o que pode ser trazido aqui para o Brasil. A BTP tem buscado mais produtividade e já conseguimos materializar alguns projetos. O mais significativo neste ano é a mudança de nosso sistema operacional que já foi inicializado e vai aprimorar ainda mais nossa capacidade de gerenciamento de pátio e planejamento de operação de navio. Após o final da implementação vamos partir para a Automação de Gates, a maioria dos terminais no mundo que já trabalha nesse sistema tem tido ganhos excelentes em termos de produtividade.
Diante das agendas de concessões de novos terminais, quais são as suas expectativas para o setor como um todo?
As outorgas são sempre positivas, se existe uma área obsoleta tem que ter outorga, ou seja, se existe demanda, tem que ter esse movimento de ampliar a oferta de capacidade. Agora, temos que partir sempre de um estudo se existe realmente essa demanda. É preciso respeitar os contratos dos atuais concessionários, considerando que todos fizeram um investimento muito alto. Colocar um terminal de contêineres em pé carece de um investimento de 1 bilhão de dólares, este é o nosso caso. Nesse sentido, você faz um business case considerando uma receita, um market share, se começam a colocar mais capacidade, o retorno passa a ser menor, o que tira o interesse no país. Acreditamos que antes de qualquer licitação deve ser avaliado um adensamento de área, algo muito positivo por ser um movimento totalmente respaldado por previsão legal.
Quais os principais desafios e oportunidades na área logística brasileira para os próximos anos?
Primeiro precisa ser feita uma ampla desburocratização do setor. Um terminal que investe 1 bilhão de dólares e quer fazer um novo investimento, precisa antes de tudo pedir autorização para o governo, agência reguladora, ministério, isso toma muito tempo, quando você vai ver aquela necessidade já passou. Segundo ponto é que precisamos ter mais segurança jurídica. O terceiro ponto é com relação a competitividade, nosso negócio é extremamente competitivo, não precisamos ter uma agência regulando preço, quem regula preço em um mercado livre é o próprio mercado. Sobre oportunidades, já estamos em uma fase de expansão de nossa área, serviços, portfólio, não queremos ser apenas um operar portuário para nossos clientes, mas sim um operador logístico com várias e modernas soluções.