Roberta Ramalho: tivemos adaptações, mas pandemia possibilitou grande empuxo na venda de barcos
Setor náutico vira a grande estrela da indústria com o aumento das vendas de barcos e iates cada vez mais modernos.
Roberta Ramalho, presidente-executiva da Intermarine. (Foto: Divulgação)
Em meio à pandemia, o setor náutico brasileiro cresceu 20% em faturamento, segundo levantamento da Associação Brasileira dos Construtores de Barcos e Implementos (Acobar). Hoje, o país tem mais de 1 milhão de habilitações liberadas pela Marinha, e quase 700 mil registros ativos de embarcações.
Para o presidente da Acobar, Eduardo Colunna, houve uma mudança de hábito: os barcos passaram a ser um lugar seguro para se isolar. Ao mesmo tempo, a nova rotina provocada pela crise sanitária permitiu acelerar trocas, buscar novos produtos e, para muitos, concretizar o sonho de comprar a primeira embarcação.
A surpreendente alta na demanda por insumos para construção e manutenção refletiu positivamente no mercado interno e, também, no exterior. Para os executivos do setor, está claro que a pandemia acelerou a cultura náutica brasileira, mas também evidenciou necessidades de investimento em infraestrutura.
Roberta Ramalho, presidente-executiva da Intermarine, um dos maiores estaleiros do país, diz que o mercado vinha amadurecendo de maneira consistente na última década, mas com a pandemia houve um enorme empuxo na venda de barcos, cenário que veio para ficar.
“Tivemos questões na produção que exigiram rápidas adaptações. A escassez de matéria prima, a dificuldade com a importação de determinados componentes e o manejo dos nossos 600 colaboradores para viabilizar o máximo de segurança possível foram desafios duros que o estaleiro conseguiu superar”, destaca a empresária, que prevê crescimento de 25% em vendas para 2022, além de ampliar o número de lançamentos.
A pandemia acelerou a cultura náutica brasileira, mas também evidenciou a necessidade de investimento em infraestrutura. Com o maior parque industrial náutico da América Latina, instalado na cidade de Osasco, em São Paulo, a Intermarine trabalha com processo vertical de produção, contando com seis fábricas especializadas. Segundo Roberta, a flexibilidade e o controle que a internalização do fornecimento permite, trouxe agilidade para adaptações, mas como grande parte dos setores, sofremos com escassez de matéria-prima e dificuldade de logística global.
“Um barco como a nossa 24M, possui cerca de 50 mil componentes, incertezas no recebimento de qualquer item podem trazer enormes problemas. Nossa estratégia foi fazer compras grandes e antecipadas. Recentemente recebemos 30 motores adiantados e esse é um bom termômetro, uma vez que nunca precisamos ter essa quantia em estoque no passado”, detalha.
Fernando Assinato, CEO do estaleiro da Armatti Yachts. (Foto: Acioni Cassaniga/Divulgação)
Peça por peça
As mudanças nos padrões de consumo do setor influenciam diretamente em toda a cadeia de serviços ligadas a marinas e estaleiros. É o caso de uma das maiores revendedoras e distribuidoras de suprimentos náuticos brasileira, a Catarina Náutica, localizada na região central de Itajaí, em Santa Catarina, que ao longo dos últimos três anos, desde 2018, tem registrado crescimento em torno de dois dígitos. Somente em 2020 a empresa comercializou cerca de 20% a mais que em 2019.
Para 2021, a projeção da Catarina Náutica é registrar crescimento ainda maior em vendas de suprimentos para embarcações, desde resinas, tintas e produtos de construção e reparo de barcos, até equipamentos eletrônicos de navegação, acessórios e artigos de moda náutica, ancoragem e salvatagem.
Com vendas na loja física e por e-commerce, a empresa possui mais de três mil itens para a distribuição em território brasileiro. A previsão é dobrar esse volume nos próximos três anos. “A venda de barcos novos e usados está muito aquecida no Brasil e no exterior, e é um comportamento que traz reflexos para toda a cadeia náutica. Notamos aumento expressivo especialmente por selantes e adesivos náuticos. Tratam-se de materiais utilizados na fase de construção de embarcações, até a fixação de vidros, e que tem como usuário final desde os estaleiros e prestadores de serviços até setores de pós-vendas e empresas especializadas em manutenções”, pontua Roberto Deschamps, diretor da Catarina Náutica.
Deschamps esclarece que a pandemia alavancou as vendas náuticas, porém, ao mesmo tempo, gerou um desafio no abastecimento das lojas com suprimentos.
“Um pedido que antes demorava 10 dias para chegar, agora leva 120 dias. Dessa maneira, por conta de nosso amplo estoque de peças e nossa filosofia de qualidade de atendimento e suporte ao cliente, aumentamos também as vendas diretas para estaleiros que às vezes não conseguem ter sua demanda atendida por falta de matéria-prima. A alta do dólar também impactou, mas não inibiu as vendas. Itens como coletes salva-vidas, por exemplo, tiveram seus valores reajustados por conta do câmbio e falta do fornecimento de tecidos”, complementa o executivo.
Potencial
Aproveitando o cenário de alta, a Azimut Yachts, marca do Grupo Azimut, líder mundial em fabricação de iates de luxo, com matriz na Itália e unidade produtiva no Brasil, também em Itajaí, acaba de lançar no país da primeira unidade do iate Atlantis 5. Isso marca o início da produção de todos os modelos da coleção Atlantis nacionalmente a partir do próximo ano, que serão destinados para mais de 70 países que a marca tem representação.
“Desde a instalação da filial produtiva no Brasil e com o sucesso crescente na produção de iates da marca Flybridge, de 40 a 100 pés, a fábrica brasileira demonstrou à matriz italiana alta performance e maturidade em termos de estrutura física e humana. Mesmo diante do cenário de crise econômica, mantivemos índices de crescimento em torno de dois dígitos ao ano e em 2020 tivemos um desenvolvimento de 40% em termos de valor de produção. Com isso, a chegada da Coleção Atlantis ao Brasil demonstra mais um impulso à indústria náutica o que reflete também em geração de empregos e impacto em vários outros setores da cadeia”, explica Davide Breviglieri, CEO da Azimut do Brasil.
Davide Breviglieri, CEO da Azimut do Brasil. (Foto: Divulgação)
Com a chegada da Atlantis, além do crescimento em exportações em torno de 60% em dois anos, a expectativa é de dobrar o volume de produção e aumentar os empregos gerados.
Agilidade
Com as mesmas perspectivas positivas, a fabricante nacional Armatti Yachts vai ampliar sua unidade produtiva. Com o crescimento em vendas de embarcações, o estaleiro cria uma linha de produção própria para o modelo 300 Spyder, sucesso da marca. Com a expansão, o quadro de funcionários aumentou em 30% e o parque fabril, que tinha cerca de 7.900 metros quadrados de área cresceu mais de 25%.
Com o aquecimento do mercado náutico no último ano, a entrega de um barco de 30 pés no país demora aproximadamente quatro meses. No caso da Armatti Yachts, instalada desde 2018 em São José, na Grande Florianópolis, com o lançamento de uma linha de produção exclusiva ao modelo, o prazo de entrega será de 30 dias.
“É um grande diferencial trazer uma linha de produção para um modelo específico de embarcação. O molde é trazido para dentro da fábrica o que nos permite uma produção rápida e em série. Dessa maneira conseguimos atender à crescente demanda de pessoas que querem comprar barco, mas não querem esperar meses na fila de espera”, esclarece Fernando Assinato, CEO do estaleiro.