Tania Cosentino, da Microsoft: inteligência artificial é o empoderamento do ser humano e não sua substituição

Ela começou a trabalhar na adolescência, formou-se em engenharia elétrica e desenvolveu carreira na indústria ao longo de três décadas. Em entrevista exclusiva, ela sobre as ações de transformação digital e a missão em viabilizar meios para preparar o profissional do futuro. 

sa267_presidente_destaqueTania Cosentino, presidente da Microsoft Brasil. (Foto: Microsoft/Divulgação)

Considerada uma das executivas mais influentes do país, a presidente da Microsoft Brasil, Tania Cosentino, em entrevista ao Show Business, fala sobre as ações de transformação digital, aceleradas pela pandemia, e a missão em viabilizar meios para preparar o profissional do futuro. 
 
Tânia detalha os investimentos da Microsoft no Brasil, que iniciou a operação de um novo data center nacional durante a pandemia, e ações que visam ampliar o portfólio de produtos que solucionam o dia a dia de empresas e de consumidores, além de capacitar 30 milhões de profissionais. 
 
Tânia Cosentino começou a trabalhar na adolescência, formou-se em engenharia elétrica e desenvolveu carreira na indústria ao longo de três décadas. Antes de assumir o comando da Microsoft Brasil, passou pela Schineider Eletric, onde começou, também, a se envolver em pautas socioambientais e de responsabilidade social. 

Eu sei que esse não é o único setor onde falta mão de obra, mas no de tecnologia o gap realmente é grande. Como é que é isso para vocês?

Mão de obra qualificada, que é uma dor de todos os segmentos de empresas aqui no Brasil e especialmente nos setores de tecnologia. Mas hoje em amplio um pouco o que é o setor de tecnologia porque a pandemia fez acelerar a transformação digital de todas as empresas de qualquer segmento do mercado. Então, quando a gente olha para o iFood ou por um grande hospital ou para uma empresa de energia, essas empresas, elas buscam contratar profissionais da área de tecnologia num número maior do que profissionais da sua área core, da sua área central de negócios. Isso gerou uma demanda excessiva e uma pressão adicional por mão de obra no segmento.

Como é que nós poderíamos combater esse tipo de coisa?

O desafio é tão grande, falando especificamente em tecnologia, nós temos constantemente 400 mil posições em aberto no Brasil. E cada ano se somam 40 mil posições, porque formamos menos profissionais do que precisamos.

Você está contando só com a Microsoft ou com o setor mercado?

Mercado. Esse é um dado da Brasscom, que é a Associação Brasileira das Empresas de Tecnologia e Comunicações. Então nós temos um gap de mão de obra de 400 mil profissionais e, adicionalmente, formamos uma média de 46 mil profissionais de tecnologia todos os anos. E a demanda do mercado é maior, é superior a 70 mil. Esses dados são pré-pandemia e estamos concluindo o estudo agora pós-pandemia, porque só piorou porque a demanda foi maior.

Vocês acreditam que piorou?

TC - Piorou porque as empresas adotaram a tecnologia como uma forma de continuidade dos negócios. Então, toda aquela transformação digital que estava no plano estratégico, ela foi para a ação e isso demandou um volume de profissionais bastante elevados. O que está acontecendo é que os profissionais estão circulando entre as empresas, o que não é o que não traz benefício para o Brasil, porque tecnologia ela pode acelerar a adoção da tecnologia para acelerar o crescimento econômico do Brasil.

Isso promoveu um aumento de salários no setor?

TC - Sem dúvida, cria-se uma inflação e, ao mesmo tempo, você retarda a adoção de tecnologia pelas empresas. E, como estava falando, a adoção de tecnologia pode trazer crescimento econômico. Nós temos um estudo junto com a FrontierView, que diz que até 2030, se a gente fizesse uma adoção de inteligência artificial na maioria das empresas, isso poderia trazer um aumento do PIB de um 1,8. Ou se fizermos a adoção plena de tecnologia de inteligência artificial, poderíamos crescer até 4 pontos percentuais do PIB.

Isso é um estudo?

TC - E um estudo que a Microsoft patrocinou com a FrontierView e esse estudo está disponível na internet. Então, o que eu preciso? Fantástico. Vamos adotar a tecnologia. Primeiro temos que avançar e a gente tem trabalhado muito com o marco da inteligência artificial, tem uma série de questões que estão sendo trabalhadas e o Brasil está avançando. Mas o grande bloqueio é a falta de mão de obra. E o problema é tão grande que ele não pode ser, não tem expectativa que ele seja endereçado só pelo setor público. Ele tem que ser endereçado, também, pelo setor privado.

Você acha que o setor privado deveria investir mais em educação tecnológica?

Também em qualificação profissional, sim, porque também tem vários estudos que mostram que, desde 2008, os investimentos na qualificação profissional dentro das empresas diminuíram bastante, de forma significativa. Trabalhamos a educação de uma forma muito ampla. Nós somos embaixadores do ODS4, o Objetivo do Desenvolvimento Sustentável número 4, que é educação de qualidade para todos, e criamos nesses últimos dois anos vários programas de qualificação em massa, porque o nosso problema é de milhões. Não é um problema de milhares de pessoas, mas nós criamos e lançamos, em setembro do ano passado, um programa em parceria com o LinkedIn para qualificar 25 milhões de pessoas no mundo. Baseados em que tipo de habilidades? Nas habilidades identificadas como GAP no LinkedIn, o próprio estatístico do LinkedIn determinou que algumas habilidades, e aí tem técnicas de venda, técnicas de negociação, gerenciamento de projetos, entre outras. E a gente lançou esse treinamento.

Pode revelar o montante que está sendo investido?

Não, não posso falar de valores investidos. Eu posso falar só de número de pessoas. A gente lançou o programa para 25 milhões de pessoas no mundo. Já mudamos, subimos a meta para 30 milhões de pessoas e só no Brasil já temos mais de 3 milhões de pessoas envolvidas nesse curso. E fizemos também uma parceria com o SEPEC, a Secretaria de Produtividade, Competitividade dentro do Ministério da Economia, para levar as nossas trilhas de educação digital, desde o letramento digital porque, eu ouço muita gente falar ‘eu sou um analfabeto digital’. Isso não é um problema. Então, desde letramento digital, passando por linguagens de programação ou ciência de dados. Levamos essas trilhas em português gratuitamente dentro da Escola do Trabalhador 4.0. E nós precisamos divulgar mais isso porque nós queremos atingir 5 milhões de brasileiros. Isso é um treinamento para os nossos brasileiros e brasileiras.

Tânia, explica para o nosso telespectador o que é a Indústria 4.0.

 Bom, nós comentamos das revoluções industriais, a máquina a vapor, depois a máquina elétrica... A primeira Revolução Industrial máquina a vapor, depois a máquina elétrica, segunda Revolução Industrial, terceira Revolução Industrial passamos por toda a automatização. E eu vivi isso, porque eu venho do ramo de automação. Mas, como disse anteriormente, levou mais de 30 anos para você poder automatizar os processos. E isso permitiu com que os profissionais fossem se ajustando ao longo da transformação. E chega agora uma nova revolução, que é a revolução provocada pela transformação digital. E atribuímos a revolução digital a isso que chamamos de Indústria 4.0, que é uma nova transformação industrial, uma revolução industrial. E aí a Escola do Trabalhador 4.0 ela faz menção a preparar o profissional para essa indústria, para esse novo contexto.

O mundo vai conseguir adaptar o crescimento da mão de obra necessária para uma indústria 4.0, uma indústria do futuro? Ou teme se algum gap? Vamos dizer, a tecnologia vai andar mais rápido que a formação e aí estamos todos num problema difícil, né?

Eu acredito que é um desafio enorme. A tecnologia sempre vai andar mais rápido, mas as empresas...

A Revolução Industrial não fazia isso, né. Ela teve 30 anos...

Mas a tecnologia sempre esteve à frente dos profissionais e isso desafiava a nossa que a nossa formação fosse contínua. Eu acho que essa é uma grande mudança já do paradigma, que é a formação contínua do momento que você entra no mercado de trabalho até o seu último dia no mercado de trabalho, o que a gente chama em inglês de life long learning, que é a nossa vida de aprendizado do início ao fim. Então, não basta falar ‘Eu tenho meu diploma e fiz uma pós graduação’. Isso é o suficiente? Não é suficiente, porque a tecnologia traz transformações, traz novas necessidades e nós vivemos num mundo de personalização, de uma customização de soluções para atender os clientes, que realmente transforma a forma como se relaciona, como você usa a tecnologia, como você vende, como você compra, como você estuda. Então, a tecnologia sempre vai estar na frente, mas isso não deveria ser um obstáculo, talvez é a cenourinha que nós devemos perseguir. O que nós precisamos é nos estruturar e a união do setor público e do setor privado é fundamental. O setor público é incapaz resolver isso sozinho. E o setor privado um pouco.

Caiu a ficha do setor privado, que o setor público não consegue mesmo?

Acredito que sim, mas o setor privado em lugar nenhum do mundo, porque o desafio é grande demais. Os desafios do momento de clima, os desafios que estamos discutindo tanto por causa da COP 26, de educação e alguns desafios sociais são grandes demais. E se nós quisermos endereçar esses desafios num espaço de tempo devido, curto, precisa do setor privado. E é por isso que se fala tanto do ESG que acho que está todo mundo hoje ouvindo falar sobre isso, que são os compromissos do setor privado com relação aos seus impactos ambientais, sociais e de governança. Então, o setor privado está sendo chamado para a conversa, e nisso a Microsoft sai na frente porque nós lançamos e faz parte do nosso negócio criar programas para desenvolver e acelerar, fazer o que é catch up, como falamos inglês, mas realmente acelerar e permitir que as pessoas se qualifiquem. E isso é bom para a própria Microsoft, mas para os clientes da Microsoft e para o mundo, para os países onde estamos inseridos.

Está muito defasado do resto do mundo nesse sentido?

Está. Eu não vi ainda o estudo desse ano, mas no ano passado saiu o Índice Global de Talentos no Fórum Econômico Mundial e mostrou o Brasil na 80ª posição. Ganhou oito posições em relação ao ano anterior. O Brasil evoluiu e a própria educação brasileira evolui, mas num ritmo muito mais lento do que nós precisamos. Então, precisamos de senso de urgência, precisamos de programas de educação, de qualificação e de retenção e até da atração de talentos. Esse Índice Global de Talentos, quando nos coloca na 80ª posição, ele nos mostra a incapacidade do Brasil formar talentos, atrair talentos, e reter talentos.

Isso que eu ia te perguntar. Os talentos formados aqui estão indo embora e isso é estatístico. O que a gente podia fazer no curto prazo para reter esses talentos?

E agora eles vão embora virtualmente, porque você não precisa nem sair do Brasil para trabalhar para uma empresa no exterior, essa é a vantagem da beleza da transformação digital. Isso é uma vantagem que nós temos hoje, como profissionais, como indivíduos, de poder escolher onde eu vou trabalhar. O mundo hoje nos permite isso e o que eu tenho que fazer? Tenho que atrair o brasileiro a ficar, mas para isso eu preciso mostrar potencial. O que retém funcionário dentro de uma empresa que é a mesma coisa que vai reter esse profissional no Brasil? E a possibilidade de crescimento dentro do país ou dentro da empresa.

Eu estou vendo aqui que vocês fizeram um novo datacenter na pandemia. Que tamanho é esse datacenter e qual a porcentagem de crescimento que significa isso para a Microsoft Brasil?

Nós temos um datacenter no Brasil desde 2014. Nós não falamos em tamanho, mas falamos em serviços que nós estamos incorporando todos os dias, praticamente. A evolução nesse mundo de transformação digital é tão grande que todo dia lança um novo serviço ou expanda um serviço dentro do meu datacenter. Nós lançamos no início desse ano uma segunda região e várias zonas de disponibilidade O que significa isso você? Para você acelerar a transformação digital dentro de um país, e a nuvem é o grande facilitador disso. A nuvem pública é o datacenter da Microsoft. É uma nuvem pública. Eu preciso garantir para os nossos clientes resiliência, eu preciso garantir disponibilidade e, até para atender às leis brasileiras, o que a gente chama de data residence, a residência de dados. Os dados precisam estar no Brasil e não só o dado original, mas as suas cópias e as suas réplicas também no Brasil.

 Isso é uma lei?

 O governo exige isso. Isso é uma regulamentação.

É só o governo brasileiro?

Não, não. Isso é uma das grandes questões até dentro da Europa. Se você pega a Europa, se coloca ela toda no território brasileiro. E aí você vê discussões de países dentro da zona da Comunidade Europeia discutindo data residence. Essa é uma discussão séria que vem acontecendo diferentes países.

O seria a residência dos dados? É eles ficarem em um datacenter brasileiro?

Dentro de uma geografia brasileira.

Mas que impede? Enfim, dois segundos você consegue transferir todos os estados onde você quiser?

Sim, tanto que eu tenho clientes aqui que têm os dados baseados no meu datacenter, com réplica em qualquer lugar do mundo. Existe um problema que se chama latência, que é o tempo de resposta, então a distância de um segundo datacenter ela impacta na latência, então ter outro datacenter próximo traz resiliência, disponibilidade e traz baixa latência. Mas traz residência de dados para o mercado brasileiro.

ae2e552cdf07e421f0792e2146196e05Tania Cosentino foi a entrevistada da jornalista Sonia Racy, no Show Business. (Foto: Divulgação)

Mesmo com o 5G? Quando entrar o sistema 5G, o tamanho vai ser maior?

Vai.  5G vai permitir que eu conecte mais dispositivos na nuvem e a gente vai conseguir levar a inteligência ao dispositivo. Imagina isso no campo, nossa agricultura que cresce e cresce pela adoção de tecnologia. Nós vamos poder ter ela toda conectada e ter informações em tempo real. Nós vamos poder ter carros autônomos. Nós vamos poder fazer cirurgias totalmente virtuais, remotas, com realidade mista, porque você vai ter resposta em tempo real e com o dispositivo conectado. Então eu tenho aqui a minha baixa latência, conhecida pela minha nuvem. Mas eu conectado dispositivo e agrega inteligência a ele. Isso faz uma nova revolução dentro da nossa indústria 4.0. Vai permitir abrir serviços e transformar setores da economia.

Agora, para o consumidor em si, pessoa física, não muda muito o 4G para o 5G, ou muda?

Vai ser bom para o streaming, para ver aquela série, para baixar vídeos.

Mas aí vai ser o quê? 3 segundos, 5 segundos a menos ou mais?

Nós estamos ficando cada vez mais impacientes. O download de um vídeo é algo que incomoda. Para jogar, uma das coisas fantásticas da nossa família Xbox, durante a pandemia, ela foi um pouco do alívio para as famílias poderem ficar distraídas de casa. Foi um game que cresceu bastante e agora o game está crescendo por streaming, e você não pode estar aqui matando o vilão naquele momento crucial do jogo e o jogo fica lento. Então o 5G ele traz bastante comodidade.

Achei que fosse só uma velocidade entre empresas.

Vai trazer. Para os gamers, sem dúvida, porque muda a forma. O streaming aí vai realmente acelerar, mas vai permitir para nós, consumidores, que as empresas inovem nos seus serviços. A nova tendência é a    personalização. Eu entro num lugar ou eu entro num canal virtual, me comunico com a empresa, aquela empresa que se eu me conhecer e precisa atender a Tânia que tem um perfil totalmente diferente da Sônia. E essa personalização vai ser baseada em dados que o sistema captura e dados de diferentes fontes. Então, o 5G vai permitir isso. Mas o algorítimo ele vai pegar a tendência que prevalece e vai conseguir. Essa é a beleza do algoritmo, você bem treinado. Por isso que nós falamos tanto no uso ético da inteligência artificial. Porque quando você treina o algoritmo se você treinar com vieses, ele não vai refletir a Tânia, mas sim o viés de quem o programou. Exatamente, esse é o grande risco que nós corremos também e precisamos trabalhar. É uma outra frente que a Microsoft ela atua bastante é a discussão da ética em inteligência artificial. Desde o desenvolvimento de um produto, do treinamento, de um algoritmo. Eu não posso ampliar o preconceito. Eu não posso criar condições inseguras. Eu preciso respeitar a privacidade dados no Brasil. Nós temos LGPD, que é um avanço.

Eu queria voltar um pouquinho e para explicar também para o nosso telespectador o que é o conceito de inteligência artificial. Não é a substituição do ser humano, né?

Não, é o empoderamento do ser humano, a amplificação da engenhosidade do humano. E hoje a gente vê, já havia um pouco de colaboração com o robô, máquina e homem no momento da era da automação, e hoje a gente vê que isso também é ampliado. A inteligência artificial ela consegue treinar o algoritmo e fazer com que esse algoritmo aprenda com a informação e com os processos que ele executa, o que a gente chama de aprendizado de máquina. Ele aprende na execução de tarefas. Isso enriquece o algoritmo e ele vai permitir dar insights, apoiar na transformação de qualquer negócio. Então isso é bastante poderoso.

As geladeiras, por exemplo, estão previstas para fazer reposição.

Lista de compras.

Lista de compras de coisas que você gosta. E se eu mudo de gosto, eu aviso quem?

Você não muda de dia para noite. Você vai treinar o algoritmo para ele perceber seus gostos e as suas tendências, perceber os seus movimentos. Você pode sempre falar com o algoritmo, também. Você pode ir lá e treinar o algoritmo. Mas olha o que a gente tem hoje nos aplicativos de navegação, você pode mudar de caminho e ele está sempre procurando a melhor opção ou ele te dá várias opções e vai dizer ‘você quer a mais curta, você quer mais rápida, você quer que pague ou não paga pedágio’. Esse é o tipo de coisa, a interação do humano com aquela que se chama de colaboração, e aí eu venho de um mundo jurássico da indústria, onde eu comecei a colocar automação e robôs dentro da indústria.

Numa época em que o ser humano servia a automação e agora a inteligência artificial que serve o ser humano.

Ele já trabalhava junto com o robô, mas o robô oferecia até um risco a vida humana. O robô ficava dentro e nas grandes indústrias automotivas, por exemplo, o robô ficava enjaulado ele ficava numa área que ele protegesse o humano, porque ele tem os movimentos bastante bruscos. Hoje, você vê o robô dentro de uma área de produção colaborando com o humano. Você vê um robô dentro de um call center interagindo com você e você não sabe diferenciar se é um robô pela voz ou se é uma inteligência artificial. Existe um refinamento, a gente incorporando linguagem natural em uma série de aplicativos que torna essa relação mais fluída. E aí você permite com que o robô aprenda o que o algoritmo aprenda na jornada.

A Microsoft foi criada há quantos anos?

Foi criada em 1975.

A Microsoft, particularmente o que ela faz para se manter no front da tecnologia?

Nós costumamos dizer que o nosso mercado não se respeita a tradição, só inovação. Então, a primeira coisa é fomentar a inovação de forma crescente e isso permeia toda a organização. Esse é o ponto número 1. Mas não é inovar por inovar, é inovar para atender o propósito. Quando a Microsoft foi fundada por Bill Gates e Paul Allen, eles queriam levar o computador pessoal para a casa de cada pessoa. Nos anos 70, quem trabalhava sabe que não existia computador pessoal. Existiam os grandes computadores dentro da empresa e nem a empresa tinha um computador individual. Parecia coisa sonhadora. Mas o que é que eles queriam por trás de levar um computador? Democratizar acesso à tecnologia. Eles sabiam que, democratizando o acesso da tecnologia, nós poderíamos criar grandes transformações. Hoje nós temos o computador na palma da mão, nós reinventamos a missão considerando a essência. A missão da Microsoft é empoderar pessoas e organizações a conquistar mais. A usar a tecnologia e amplificar o seu impacto.

Mas o que explica outras que vieram e não ficaram tão gigantes? É curioso isso porque é o que se diz, tradição não é inovação, tradição é tradição. É curioso notar isso.

Há uma diferença dentro da Microsoft. Nós tivemos coragem de romper com o nosso próprio negócio. A transformação muitas vezes... Quais foram as empresas, se olhamos num passado recente, que eram líderes em seus mercados e os mercados simplesmente desapareceram? A Kodak, como um grande exemplo porque ela não viu uma grande evolução. Ela não apostou porque ela não queria criar uma ruptura no seu próprio mercado. Então, quando você é líder, e acho que esse é o lado bom da Microsoft que nós conseguimos enxergar isso, quando você é líder você não pode se paralisar pela liderança. Você tem que continuar buscando mais ou você não pode temer perder a liderança com a próxima revolução tecnológica. Você tem que encabeçar a próxima revolução tecnológica que cria uma ruptura no seu mercado. Quando você tem essa consciência, é um risco enorme.

É um risco e deve ser um esforço diário.

De tecnologia, mas de cultura. O investimento da Microsoft na cultura de inovação e de transformação é de trabalhar pela missão, essa comunicação diária é muito grande e isso nos leva a fazer a próxima inovação tecnológica. É lógico que o crescimento de uma empresa desse tamanho, com mais de 150 mil funcionários, que cresceu bastante durante a pandemia, porque as nossas soluções habilitaram as empresas e as pessoas a continuarem com seus trabalhos. Então, a pressão em cima da organização é muito grande. Tivemos que investir datacenters, tivemos que contratar pessoal, tivemos que investir mais inovação. É lógico que a empresa tem muitos processos, ter uma boa governança em processos pesados e às vezes nós concorremos com startups, pequenas e médias empresas e empresas de nicho. Isso faz parte.

Aí vocês vão lá e compram ou não?

Nós fazemos muitas parcerias, fizemos uma compra de uma grande empresa recentemente, de linguagem natural. Tem muita coisa acontecendo nesse mundo e a Microsoft está ativa. Olhando para isso. Mas nós trabalhamos a cultura, a simplificação é uma das nossas ambições. Não vou dizer que é fácil. Ela é uma dor todo dia, porque eu brinco que nós somos uma jovem senhora. E aí a jovem senhora tem suas manias. Então, como eu mostro que essas manias não vão me levar ao futuro. Então é um trabalho de todos os dias, mas trabalhamos muito a cultura.

Você é uma das poucas mulheres nesse setor, presidente da Microsoft, Brasil. Como você se sente? Se sente representando a diversidade hoje tão exigida ou, você sentiu na sua carreira algum empecilho por ser mulher?

Eu fiz escola técnica. Desde os 14 anos, quando entrei na Escola Técnica e dos 16, quando eu comecei a trabalhar, eu me inseri no mundo predominantemente masculino e eu consegui superar os obstáculos que esse mundo me apresentou. Por isso cheguei aonde cheguei. A grande questão para mim ocorreu          quando eu assumi a presidência da Schneider Eletric Brasil em 2009, que até então eu não prestava muita atenção no tema de gênero e nada tinha me barrado. Então, eu dava muito valor para algumas questões. Quando eu assumi a presidência da Schneider em 2009 e olho para o lado e vejo que não tinham mulheres presidentes, eu entendi que eu tinha um papel a representar. E eu comecei a trabalhar não só dentro da empresa, mas fora como embaixadora, primeiro da diversidade de gênero e depois abracei outros pilares. E hoje eu trabalho muito diversidade de raça, de pessoas com deficiência, pessoas LGBTQIA+, e até de idade, porque eu saio da Schneider aos 54 anos para 55, e sou contratada para presidente de uma líder.

Conte seu segredo aqui.

Trabalho duro, trabalho duro. Eu acho que o fato de sempre entregar resultados sempre estar conectada com os meus valores. Eu nunca me desviei dos meus valores e isso foi fundamental na minha trajetória. A consistência e os seus colaboradores olham para isso. Você como líder, eles olham. Se você faz o que você faz. Então, consistência é a base para você se manter no posto. Mas eu entendi olhando para trás que o que não me parou para outras mulheres, e aí por diversas razões. Então, eu me comprometi a ajudar as mulheres a desenvolverem suas carreiras dentro da área executiva. Mulheres em conselho é uma outra questão. Estamos falando cada vez mais mulheres em conselhos de empresa e, também, estou comprometida a trazer mais jovens e mais meninas para o mundo. Tecnologia porque é uma área super legal. Você pode crescer tanto na área executiva como eu cresci, mas pode crescer também na área técnica. Você pode transformar a sociedade, você pode impactar o planeta com soluções, então é uma área super gostosa, que paga bem, que tem uma alta remuneração e que o mercado demanda. Então é uma área de pleno emprego.

Eu queria que você deixasse uma mensagem para nosso telespectador.

Ou eu queria agradecer pela audiência, pela por você estar assistindo a gente hoje. Obrigada a Sônia pelo convite e gostaria só de reforçar a importância de trabalharmos a educação. A educação desde a educação fundamental, ensino médio. Falo muito ensino profissionalizante. Eu sou uma técnica da Escola Técnica Federal de São Paulo, hoje Instituto Federal de Educação, é importantíssimo trabalharmos trilhas técnicas e o superior, mas, ao mesmo tempo, trabalharmos na capacitação e recapacitação profissional de quem está no mercado. Isso é para evitar uma bolha social e uma ruptura social ainda maior no nosso número de desempregados. A pandemia aumentou a desigualdade e cabe a nós agora nos unirmos para reduzir essa desigualdade. E sim, é possível. E a tecnologia está aqui para ajudar.